Nas asas da formação, futebol português aponta a outros voos

Março 2023 | Por: Tiago F. Silva

Diz-se que o futebol é das poucas modalidades onde nem sempre o mais poderoso vence, sendo que o mais poderoso também não é necessariamente o que detém maior poder financeiro.

Esta premissa mantém-se, pese embora seja também cada vez mais óbvio a influência que uma boa saúde financeira pode ter no capítulo desportivo, não apenas no desempenho dentro de campo, como também pela capacidade de suprir despesa com mais e melhor receita.

Depois de algum tempo de adormecimento, o futebol português acordou a tempo e primeiro que outros para uma realidade premente, que se prende com a necessidade de apostar na formação.

Perante o menor poder económico, por comparação com os clubes dos principais campeonatos europeus, os portugueses perceberam que o segredo passava pela formação e potenciação dos seus jogadores.

Na realidade, dos muitos predicados que podemos apontar ao futebol português, o talento é sem sombra de dúvida aquele que mais colhe consenso atualmente. Não é de estranhar, portanto, o crescente apetite dos grandes clubes europeus pelas “pérolas” da formação portuguesa, e cada vez em mais tenra idade.

Um estudo publicado recentemente pelo Observatório do Futebol (CIES), vem atestar a excelência da formação portuguesa, com Portugal a deter três representantes no top-15 dos clubes com a formação mais valiosa a nível mundial.

O Benfica lidera mesmo este ranking, mas é interessante verificar que tanto Sporting como FC Porto ocupam igualmente um lugar de destaque por entre alguns dos principais clubes mundiais.

No estudo, o CIES estima o valor de transferência de jogadores de mais de 50 campeonatos, tenho como requisito obrigatório o terem jogado, pelo menos, três anos no clube, entre os 15 e os 21 anos.

O Benfica surge então no topo da lista, como o clube cujos ativos formados na academia mais valem em conjunto. Os encarnados apresentam-se com 104 jogadores e um valor global estimado em 670 milhões de euros.

A completar o pódio estão o Chelsea, com 78 jogadores avaliados em 630 milhões de euros, e o Barcelona, com 102 jogadores avaliados em 581 milhões de euros.

O clube português mais próximo no ranking é o Sporting, que ocupa o 10.º lugar, com 97 jogadores e um valor global estimado em 399 milhões de euros, o mesmo que o Arsenal, pese embora os gunners apresentem apenas 79 jogadores nas condições referidas anteriormente.

Já o FC Porto fecha o top-15, com 71 jogadores e um valor global estimado em 350 milhões de euros, bem próximo do Real Madrid, que se apresenta com 97 jogadores avaliados em 359 milhões de euros.

Nota ainda para a afirmação de clubes como Ajax (4.º), Manchester City (5.º) e Paris Saint-Germain (6.º) na lista das formações mais valiosas do mundo, assim como para a existência de quatro clubes brasileiros no top-15, casos de Santos (7.º), Flamengo (8.º), São Paulo (9.º) e Fluminense (13.º), históricos da formação canarinha que figuram como representantes maiores dos chamados mercados emergentes e que continuam a ser responsáveis por alguns dos maiores talentos do futebol atual.

Contas feitas, 1.419 milhões de euros é o valor global estimado da formação dos três principais clubes portugueses atualmente. Importa ainda dizer que cerca de ¼ deste valor (336 milhões) reporta aos jogadores cujos direitos desportivos pertencem na íntegra aos clubes, com o Benfica a liderar também neste capítulo (151 milhões), mas onde o FC Porto (101 milhões) se sobrepõe ao Sporting (84 milhões).

Todos estes indicadores deixam bem claro algo que já todos os adeptos de futebol sabem há alguns anos, neste caso a excelência da formação portuguesa. Ironicamente, ou não, a formação tem acabado por servir mais os objetivos financeiros do que os desportivos.

Ainda assim, também não há dúvidas de que essas receitas têm permitido gerar maior competitividade e qualidade nos clubes portugueses, algo que é de vital importância quando Portugal se bate por conquistar e manter um lugar no top-5 das principais ligas europeias.

Se o segredo para o sucesso desportivo e financeiro passa pela formação, pode então dizer-se que para os portugueses não há segredos.